O olhar de Filipe Sereno sobre o Europeu em França
Enderecei um conjunto de perguntas, através de mail, para alguns dos presentes neste Europeu em França.
A visão deles em relação ao Europeu é muito útil para todos os que gostam da modalidade e que pretendem melhorar.
Na verdade, escreve-se pouco sobre Patinagem Artística e também não há reflexão sobre os acontecimentos que entretanto vão acontecendo.
A visão deles em relação ao Europeu é muito útil para todos os que gostam da modalidade e que pretendem melhorar.
Na verdade, escreve-se pouco sobre Patinagem Artística e também não há reflexão sobre os acontecimentos que entretanto vão acontecendo.
O Filipe Sereno foi o primeiro a responder. Muito Obrigado Filipe! Um grande bem haja.
1- Como eram as instalações, o piso e a organização?
FILIPE- As instalações eram boas, tinha um piso em mosaico muito rápido mas com uma contrariedade...variava de acordo com a temperatura no pavilhão, uns dias prendia outros escorregava bastante, e num mesmo dia podia variar também o que implicava um constante reajustamento de rodas. A organização da prova por parte dos franceses foi boa, desta vez as comitivas tinham um local próximo do pavilhão para refeições a preços acessiveis e com alguma qualidade. A nível da CEPA e com a ausência de algumas selecções não houve o melhor reajustamento dos horários, houveram intervalos demasiados longos entre provas (30 a 40 minutos) e entre treinos e provas (chegou as 2h30) em alguns dias, enquanto que noutros dias os atletas tiveram prova uma hora depois de terem treino.
2- Quem está de fora fica com a sensação que a França está a fazer um grande investimento na patinagem artística. Isto é verdade? Qual a tua opinião sobre a forma e o caminho que os franceses estão a percorrer? Haverá algumas lições a tirar dos franceses?
FILIPE- A frança esta a fazer realmente um grande investimento na patinagem, mas já há alguns anos. E principalmente nos escalões de formação. Têm vindo a seguir um caminho progressivo de evolução. Há anos que participam em diversas provas internacionais de alto nível como a taça de Itália e taça da Alemanha, além de outros torneios secundários em Itália, tudo costeado pela federação. Têm investido também fortemente na formação constante e anual com treinadores italianos em todas as disciplinas. Igualmente têm "trabalhado" a sua influência junto dos juízes. Outro aspecto importante, participam sempre em mundiais e tentam participar em europeus com o maior número de atletas que acompanham ao longo do ano em diversos estágios e formações e não apenas em observações dos nacionais.
3- Este campeonato foi diferente do habitual porque houve países (por exemplo a Alemanha) que não participaram. O que se passou? Estamos perante uma guerrilha entre países ou entre um país e a CEPA?
FILIPE- Em relação a esse tema não sei dizer muito. Mas não é só a Alemanha que não concorda com esta data do europeu de juniores e seniores. A Itália também não concorda mas não tomou a mesma medida drástica. A competitividade do europeu não se perdeu, foi um campeonato muito competitivo mas claro que Itália sabendo que a Alemanha não ia participar não levou os melhores em algumas disciplinas.
4- Os níveis técnico e o artístico apresentados no campeonato foram baixos/médios/altos? Que atleta ou par se destacou pela positiva? e pela negativa?
FILIPE- Acho que em juniores o nível estava abaixo do normal mas as provas foram competitivas. Não há muitos anos os juniores portugueses para ficarem no pódio tinham que realizar todos os triplos completos. Nos seniores o nível estava alto, normal, mas a maioria dos atletas femininos e masculinos falharam nas provas. Houveram provas em que atletas de alto nível (faziam os triplos todos por exemplo) não conseguiram realizar um único elemento. Nos femininos era ver quem falhava menos e assim ganhou a eslovena com duas provas limpas mas com muitas falhas a nível técnico. Nos pares de dança houveram pares que surpreenderam pela positiva. Acho que os pares juniores portugueses realizaram excelentes provas. Os pares seniores houve um bom nível até metade da tabela.
Houveram alguns destaques...
...primeiros toda a comitiva portuguesa pelo esforço e empenho que pudemos assistir...depois...a eslovena que ganhou patinagem livre seniores com grande (grande é pouco) força e garra, a Marta Ferreira pela medalha em patinagem livre e que podia ter tido algo mais, o francês que ganhou os juniores após dois anos a ser "afastado" dos lugares cimeiros e que aproveitou o factor casa, o par de dança que ganhou os seniores (campeões do mundo de juniores do ano passado e 1º ano de seniores) era excelente e dentro de pouco tempo serão os sucessores dos outros pares italianos durante muito tempo...
...pela negativa as muitas provas completamente falhadas, os rapazes seniores espanhóis foram a desilusão, os pares artísticos praticamente se resumem aos italianos...e o ajuizamento que, dentro do normal dos europeus, cada um puxa para si e faz jogos com determinado país para ser beneficiado em determinada prova. E o facto dos juizes "puxarem" apenas para um(a) atleta do seu país.
Mas o factor mais negativo, talvez o mais polémico, mas que deve ser referido.
Foi a percepção da existência de dopping no mundo da patinagem artística a nível europeu por parte das principais nações.
Os atletas masculinos e femininos aparecem com valores corporais acima do normal aproveitando a inexistência de controlos nos europeus e mundiais e são os próprios a assumir que tomam determinadas substâncias para manterem os corpos secos e com determinada massa muscular.
5- A selecção portuguesa esteve bem ? Ainda fomos penalizados?
FILIPE- A selecção no geral esteve bem. Tivemos um número de medalhas fora do normal mas porque os atletas se empenharam e se bateram de igual para igual com as restantes selecções. Continuámos a falhar muito nos programas curtos, e além da própria falha continuámos a realizar exercícios de elevado grau técnico quando ainda não têm uma a fiabilidade desejada. Perdemos muitos pontos nos curtos e muitas medalhas por esse factor.
Em algumas provas continuámos a ser prejudicados. Certos juizes estão lá apenas para beneficiar os seus ou apenas um do país. Não se compreende como pares não são penalizados por saírem da musica nas danças obrigatórias ou fazerem menos que as duas voltas exigidas nos piões de par ou fazerem as rectas fora dos eixos longitudinais. Se fossemos nós éramos claramente penalizados.
No entanto no geral acho que começamos a ter algum poder junto dos pontos de decisão e isso manifesta-se nas medalhas que conseguimos com todo o mérito.
6- Qual a maior diferença que se sente entre a nossa patinagem e a dos países mais desenvolvidos?
FILIPE- Em certos escalões não é muita a nível técnico. Claro que falo sobre este europeu. Se Itália levasse os melhores aí a diferença era abismal...Os portugueses têm a mesma capacidade que os outros. Acho que onde se nota mais é ao nível da patinagem de base. Ao nível dos esquemas nem se fala. Há atletas que fazendo menos que os portugueses ficam à frente porque a construção dos esquemas é feita ao pormenor e apostam nos exercícios que estão seguros, com coreógrafos para essa função. Muitas vezes descemos na nota B ou mantemos ou subimos poucas décimas. Mas outros sobem 5 a 8 décimas e por vezes combatem a nossa superioridade a nível técnico...
7- Do teu ponto de vista, temos (Portugal) desenvolvido ou estagnamos?
FILIPE- Para falar a verdade estagnamos...não nas medalhas mas naquilo que nos interessa verdadeiramente. Mas não em todas as disciplinas.
Em Portugal vamos tendo atletas que vão aparecendo e que nos permitem continuar a lutar. Mas o problema não é só nosso. Em Itália já não têm os valores que tinham antes. Em Espanha igual. Penso que é um problema geral. Só que eles têm uma base mais alargada onde podem descobrir mais talentos.
Mas penso que os treinadores portugueses fazem um excelente trabalho nas condições que lhes são oferecidas. Os atletas que competem com os portugueses a nível europeu e mundial não treinam normalmente no meio de 20 ou 30 atletas de todos os escalões, têm treinos individualizados onde se pode ir ao pormenor. Os próprios treinadores não são normalmente treinadores de toda a escola e sim de alguns atletas ou de uma disciplina.
8- Há algum aspectos que merece ser falado e que não foi abordado nas perguntas efectuadas?
FILIPE- Sim. Deixo uns pormenores para reflexão...
- dos 4 primeiros classificados na dança sénior 3 eram o 1º ano que faziam par juntos. O 4º classificado, os espanhóis, o rapaz fazia patinagem livre no ano passado e este ano dedicou-se à dança.
- os espanhóis para participarem num mundial têm que se classificar até ao 5º lugar no europeu.
- o novo regulamento português tem algumas falhas que estrangulam completamente a evolução nos escalões de formação e que destruem os clubes aos poucos.
- o plano de formação anual que a FPP. Os espanhóis e franceses têm no mínimo 3 sessões de formação por disciplina por ano com técnicos italianos, além dos intercâmbios em Itália.
Mais uma vez agradecemos ao Filipe as suas valiosas palavras. Até breve.
1- Como eram as instalações, o piso e a organização?
FILIPE- As instalações eram boas, tinha um piso em mosaico muito rápido mas com uma contrariedade...variava de acordo com a temperatura no pavilhão, uns dias prendia outros escorregava bastante, e num mesmo dia podia variar também o que implicava um constante reajustamento de rodas. A organização da prova por parte dos franceses foi boa, desta vez as comitivas tinham um local próximo do pavilhão para refeições a preços acessiveis e com alguma qualidade. A nível da CEPA e com a ausência de algumas selecções não houve o melhor reajustamento dos horários, houveram intervalos demasiados longos entre provas (30 a 40 minutos) e entre treinos e provas (chegou as 2h30) em alguns dias, enquanto que noutros dias os atletas tiveram prova uma hora depois de terem treino.
2- Quem está de fora fica com a sensação que a França está a fazer um grande investimento na patinagem artística. Isto é verdade? Qual a tua opinião sobre a forma e o caminho que os franceses estão a percorrer? Haverá algumas lições a tirar dos franceses?
FILIPE- A frança esta a fazer realmente um grande investimento na patinagem, mas já há alguns anos. E principalmente nos escalões de formação. Têm vindo a seguir um caminho progressivo de evolução. Há anos que participam em diversas provas internacionais de alto nível como a taça de Itália e taça da Alemanha, além de outros torneios secundários em Itália, tudo costeado pela federação. Têm investido também fortemente na formação constante e anual com treinadores italianos em todas as disciplinas. Igualmente têm "trabalhado" a sua influência junto dos juízes. Outro aspecto importante, participam sempre em mundiais e tentam participar em europeus com o maior número de atletas que acompanham ao longo do ano em diversos estágios e formações e não apenas em observações dos nacionais.
3- Este campeonato foi diferente do habitual porque houve países (por exemplo a Alemanha) que não participaram. O que se passou? Estamos perante uma guerrilha entre países ou entre um país e a CEPA?
FILIPE- Em relação a esse tema não sei dizer muito. Mas não é só a Alemanha que não concorda com esta data do europeu de juniores e seniores. A Itália também não concorda mas não tomou a mesma medida drástica. A competitividade do europeu não se perdeu, foi um campeonato muito competitivo mas claro que Itália sabendo que a Alemanha não ia participar não levou os melhores em algumas disciplinas.
4- Os níveis técnico e o artístico apresentados no campeonato foram baixos/médios/altos? Que atleta ou par se destacou pela positiva? e pela negativa?
FILIPE- Acho que em juniores o nível estava abaixo do normal mas as provas foram competitivas. Não há muitos anos os juniores portugueses para ficarem no pódio tinham que realizar todos os triplos completos. Nos seniores o nível estava alto, normal, mas a maioria dos atletas femininos e masculinos falharam nas provas. Houveram provas em que atletas de alto nível (faziam os triplos todos por exemplo) não conseguiram realizar um único elemento. Nos femininos era ver quem falhava menos e assim ganhou a eslovena com duas provas limpas mas com muitas falhas a nível técnico. Nos pares de dança houveram pares que surpreenderam pela positiva. Acho que os pares juniores portugueses realizaram excelentes provas. Os pares seniores houve um bom nível até metade da tabela.
Houveram alguns destaques...
...primeiros toda a comitiva portuguesa pelo esforço e empenho que pudemos assistir...depois...a eslovena que ganhou patinagem livre seniores com grande (grande é pouco) força e garra, a Marta Ferreira pela medalha em patinagem livre e que podia ter tido algo mais, o francês que ganhou os juniores após dois anos a ser "afastado" dos lugares cimeiros e que aproveitou o factor casa, o par de dança que ganhou os seniores (campeões do mundo de juniores do ano passado e 1º ano de seniores) era excelente e dentro de pouco tempo serão os sucessores dos outros pares italianos durante muito tempo...
...pela negativa as muitas provas completamente falhadas, os rapazes seniores espanhóis foram a desilusão, os pares artísticos praticamente se resumem aos italianos...e o ajuizamento que, dentro do normal dos europeus, cada um puxa para si e faz jogos com determinado país para ser beneficiado em determinada prova. E o facto dos juizes "puxarem" apenas para um(a) atleta do seu país.
Mas o factor mais negativo, talvez o mais polémico, mas que deve ser referido.
Foi a percepção da existência de dopping no mundo da patinagem artística a nível europeu por parte das principais nações.
Os atletas masculinos e femininos aparecem com valores corporais acima do normal aproveitando a inexistência de controlos nos europeus e mundiais e são os próprios a assumir que tomam determinadas substâncias para manterem os corpos secos e com determinada massa muscular.
5- A selecção portuguesa esteve bem ? Ainda fomos penalizados?
FILIPE- A selecção no geral esteve bem. Tivemos um número de medalhas fora do normal mas porque os atletas se empenharam e se bateram de igual para igual com as restantes selecções. Continuámos a falhar muito nos programas curtos, e além da própria falha continuámos a realizar exercícios de elevado grau técnico quando ainda não têm uma a fiabilidade desejada. Perdemos muitos pontos nos curtos e muitas medalhas por esse factor.
Em algumas provas continuámos a ser prejudicados. Certos juizes estão lá apenas para beneficiar os seus ou apenas um do país. Não se compreende como pares não são penalizados por saírem da musica nas danças obrigatórias ou fazerem menos que as duas voltas exigidas nos piões de par ou fazerem as rectas fora dos eixos longitudinais. Se fossemos nós éramos claramente penalizados.
No entanto no geral acho que começamos a ter algum poder junto dos pontos de decisão e isso manifesta-se nas medalhas que conseguimos com todo o mérito.
6- Qual a maior diferença que se sente entre a nossa patinagem e a dos países mais desenvolvidos?
FILIPE- Em certos escalões não é muita a nível técnico. Claro que falo sobre este europeu. Se Itália levasse os melhores aí a diferença era abismal...Os portugueses têm a mesma capacidade que os outros. Acho que onde se nota mais é ao nível da patinagem de base. Ao nível dos esquemas nem se fala. Há atletas que fazendo menos que os portugueses ficam à frente porque a construção dos esquemas é feita ao pormenor e apostam nos exercícios que estão seguros, com coreógrafos para essa função. Muitas vezes descemos na nota B ou mantemos ou subimos poucas décimas. Mas outros sobem 5 a 8 décimas e por vezes combatem a nossa superioridade a nível técnico...
7- Do teu ponto de vista, temos (Portugal) desenvolvido ou estagnamos?
FILIPE- Para falar a verdade estagnamos...não nas medalhas mas naquilo que nos interessa verdadeiramente. Mas não em todas as disciplinas.
Em Portugal vamos tendo atletas que vão aparecendo e que nos permitem continuar a lutar. Mas o problema não é só nosso. Em Itália já não têm os valores que tinham antes. Em Espanha igual. Penso que é um problema geral. Só que eles têm uma base mais alargada onde podem descobrir mais talentos.
Mas penso que os treinadores portugueses fazem um excelente trabalho nas condições que lhes são oferecidas. Os atletas que competem com os portugueses a nível europeu e mundial não treinam normalmente no meio de 20 ou 30 atletas de todos os escalões, têm treinos individualizados onde se pode ir ao pormenor. Os próprios treinadores não são normalmente treinadores de toda a escola e sim de alguns atletas ou de uma disciplina.
8- Há algum aspectos que merece ser falado e que não foi abordado nas perguntas efectuadas?
FILIPE- Sim. Deixo uns pormenores para reflexão...
- dos 4 primeiros classificados na dança sénior 3 eram o 1º ano que faziam par juntos. O 4º classificado, os espanhóis, o rapaz fazia patinagem livre no ano passado e este ano dedicou-se à dança.
- os espanhóis para participarem num mundial têm que se classificar até ao 5º lugar no europeu.
- o novo regulamento português tem algumas falhas que estrangulam completamente a evolução nos escalões de formação e que destruem os clubes aos poucos.
- o plano de formação anual que a FPP. Os espanhóis e franceses têm no mínimo 3 sessões de formação por disciplina por ano com técnicos italianos, além dos intercâmbios em Itália.
Mais uma vez agradecemos ao Filipe as suas valiosas palavras. Até breve.
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